quarta-feira, 10 de maio de 2017

ENTREVISTA COM CARLOS AVALONE



Caro, webleitor, a principal finalidade 
desta serie de entrevistas que tenho 
realizado ao longo dos anos com pessoas 
relevantes do setor editorial brasileiro,
da publicidade e do mundo da animação 
é registrar nesse nosso cantinho da web 
depoimentos que falam curiosidades 
dos bastidores,de suas criações e realizações profissionais.
Creio, piamente, que você, que segue essas 
nossas entrevistas, com certeza, tem se deliciado
com os bate papos descontraídos e reveladores 
que faço com gente que relata os acontecimentos 
dos últimos 30 e 40 anos, sobre os diversos 
setores da área de comunicação do país. 
Além disso, tais depoimentos são importantes
registros que fazem despertar a curiosidade e o interesse da nova geração, que atua ou 
que um dia pretende atuar e se tornar um
profissional da arte do desenho seqüencial,
da publicidade e da animação.

Participe ativamente enviando-nos a
sua opinião (críticas e sugestões) para
que outros entrevistados ilustres venham 
contar aqui suas experiências, realizações 
e frustrações.
Quem você gostaria de ver entrevistado
neste blog?

Desta feita, o artista que concordou em 
dar seu depoimento possui uma larga 
experiência no setor editorial nacional e 
é com imensa satisfação que a seguir 
vamos conhecer um pouco mais sobre
um dos grandes desenhistas deste país.
Relaxe e acompanhe atentamente a
 entrevista que fiz com...

O MESTRE AVALONE!


TONY 1: Salve, grande guru rabiscador! Apesar de não nos 
conhecermos pessoalmente, há muito tempo tenho acompa-
nhado sua trajetória profissional e esta é uma oportunidade 
de ouro para sabermos sobre seus feitos profissionais.
Grato, por sua colaboração. Afinal, sem vocês, os grandes 
mestres, este blog não seria nada. Sou grato a todos que têm
colaborado comigo. Seja bem-vindo...

AVALONE: Eu que agradeço o convite para me juntar 
a esse seleto grupo de entrevistados, Tony!

TONY 2: A primeira vez que tomei conhecimento do 
seu trabalho foi nos anos 70, através da revista Espoleta 
(dirigida às crianças) que era publicada em cores pela
saudosa editora Noblet, casa editorial na qual também 
trabalhei durante 5 anos. 
Como surgiu a oportunidade de publicar um título solo 
de um personagem criado por você? Como é quando 
conheceu o Sr. Joseph Abourbih, editor da Noblet?

AVALONE: Eu conheci o Sr. Joseph, dono da Noblet, 
da forma como era comum naquela época. 
Em 1974 peguei os originais do Espoleta e fui ao 
escritório da editora que era na Rua Marquês de Itú, 
perto da Praça da República, em São Paulo. 
Fui recebido pelo próprio. Ele verificou,
gostou e propôs publicar uma história por mês, de umas 
cinco páginas, em PB, nas páginas finais do gibi AKIM. 
Deixei os originais, ele tirou o valor combinado do bolso
e me pagou. Essa forma de se apresentar a um editor não 
existe mais. Atualmente é por e-mail, portfólio online, não 
há mais um primeiro contato espontâneo e descontraído 
entre o editor e o artista, como havia antes.

TONY 3: É verdade... tudo ficou complicado, hoje em dia.

 Mas, continue...

AVALONE:  Após algumas publicações avulsas na 

AKIM eu apresentei um projeto do gibi Espoleta, de 
32 páginas, colorido, periodicidade mensal.
O Sr. Joseph topou. Dois meses depois o gibi foi
publicado. 
Publicar um título solo é o sonho de todo autor. 
As letras nos balões eram de Dolores Maldonado,
mas eu nunca a encontrei pessoalmente. 
Algumas vezes encontrei o Marcos Maldonado 
na editora quando ele ia levar os trabalhos.


Turminha Sapeca - Ed. Saber (1973)






TONY 4: O dois estão em toda, até hoje. Como

digo sempre: Marcos e Dolores são o Casal
20 da HQs brasileiras. Rsss... 

AVALONE: Uma curiosidade desse gibi é que para
 me aliviar um pouco o Sr. Joseph fez um acordo
 informal com o Ivan Saidemberg, então roteirista
 Disney da Abril, para fornecer roteiros do Espoleta.

TONY 5: O Sainden, ele era genial... mas, eu ia morrer

sem saber que ele tinha colaborado com a Noblet...
prossiga...  

AVALONE: O acordo que o Ivan fez com o editor 
e comigo é que ele não escreveria roteiros novos, ele 
repassaria roteiros Disney, recusados pela Abril, para 
serem adaptados. Eu cheguei a ler um roteiro recusado
de Huguinho, Zezinho e Luizinho para ser adaptado para 
meus personagens, Espoleta, Gabiroba e Pixaim, caso 
precisasse. Por questões contratuais do Ivan com a Abril, 
cogitamos a possibilidade dele usar um pseudônimo. 
Mas ele recusou e pediu para colocar no expediente o 
nome da esposa dele, Thereza Saidemberg, como
colaboradora em roteiros. E assim foi feito, o nome 
dela está no expediente. O assunto na Abril era que 
todos sabiam que o roteiro era do Ivan e que ficou
 engraçado o nome da esposa dele no expediente.

TONY 6: Caramba...

AVALONE: O que ninguém sabia e não foi revelado
naquela época, era que o Ivan não escrevia, apenas
 repassava roteiros Disney recusados para serem 
“reciclados”. Mas nenhum roteiro fornecido pelo 
Ivan chegou a ser usado no gibi do Espoleta. 
Era reserva de segurança. Seria usado apenas 
se eu não conseguisse cumprir a cota do mês e eu 
sempre cumpri. 

TONY 7: Um bom profissional é assim mesmo...

mas, esta revelação foi incrível... Rsss. Jamais
imaginei uma coisa dessa. É por isso que adoro
colher os depoimentos de vocês. Muita coisa
que rola ou rolou nos bastidores acabam
vindo à tona...

AVALONE: Quando o Espoleta foi lançado, a

princípio eu não tinha uma ideia clara da dimensão 
do que estava acontecendo. Eu ainda era muito
imaturo profissionalmente.
Não havia informação fácil e instantânea como tem hoje, 
disponível na internet. Eu estava lançando um gibi solo
com 20 mil exemplares de tiragem inicial (nos números
seguintes chegou a 30 mil) e achava tudo aquilo apenas...
legal! O gibi era distribuído nacionalmente em bancas 
pela poderosa Distribuidora Abril. 

Naquela época ainda não existia a DINAP, só depois a
Distribuidora Abril se desmembrou da Editora e se
tornou DINAP, mas continuou sendo do Grupo Abril.
Lá pelo terceiro número, quando eu percebi que estava
recebendo cartas de leitores do Amazonas, do Rio 
Grande do Sul, do Ceará... aí caiu a ficha, aquilo era
grande, tava na hora de renegociar os valores
financeiros. Então começou a encrenca que me
faria cair fora.


Editora Noblet (1974)




TONY 8: Quantos anos você tinha, na época?

AVALONE: Quando publiquei uma HQ como profissional 

pela primeira vez, foi no suplemento do Diário de S. Paulo. 
Eu tinha 17 anos de idade. Mas eu entrei na profissão de 
desenhista um pouco antes, com 15 anos.

TONY 9: Começou ainda garoto... Antes da Noblet, que 
outras experiências profissionais, na área editorial, 
você teve, grande guru? 
Publicou pela primeira vez em 
que ano, como, quando e por quê?

AVALONE:  Quando eu entrei na profissão eu nem 
sequer estava procurando emprego de desenhista. 
Eu queria ser desenhista, porém mais pra frente. 
Foi devido a uma típica coincidência de lugar certo + 
hora certa + pessoa certa. Eu comecei com 15 anos de 
idade e de uma forma nada exemplar: sendo demitido.
Foi na Start Filmes (hoje Start Anima), do Walbercy 
Ribas. Lá estava, também em início de carreira, o
Cesar Sandoval. Ele devia ter uns 20 anos de idade.

Na minha época a formação mais comum no estúdio

capas foi a seguinte (alguns entraram e outros saíram 
no meu período): Izomar Camargo, Luiz Podavin, 
Moacir Rodrigues, Napoleão Figueiredo, Paulo Renato
Dacosta, José Roberto Gregório (Grego), Hideraldo 
Montenegro, Luiz Carlos Natalino (Ringo), Natanael
Aleixo, João Xavier de Campos (Jox), Só Hi Kim, Paulo 
José da Silva e Henrique DeFarias. Essa equipe fazia 
todas as capas das infantis, não apenas as Disney, 
mas também de Hanna Barbera, Pantera Cor-de-rosa, 
Bolinha e Luluzinha, Conan, enfim, todas as capas 
de quadrinhos nessa época eram feitas 
nesse departamento. 

TONY 10: Conheci o Sandoval na Abril em 1973,

na avenida Faria Lima...

AVALONE: Eu creio que fui demitido por deixar claro,

até na prática, pintando acetatos com má vontade, 
que não me interessava por desenho animado.
Eu só queria saber de quadrinhos. 
Recentemente publiquei no meu Face um 
post contando em detalhes essa divertida história. 
Está aqui nesse link: http://bit.ly/2nkZK3e  


Avalone sentado à esquerda - 1975 - Com a turma da MSP
Sidnei Losano Salustre (paletó branco), Avalone (paletó Marron)
com Mauricio de Sousa e a Turma do Estúdio (1975)

TONY 11: Normal, o seu negócio era HQs...


AVALONE: Já na área de quadrinhos eu publiquei 

pela primeira vez no Clubinho, suplemento infantil 
dominical do hoje extinto Diário de S. Paulo, em 1972.
Eu tinha 17 anos. Nessa ocasião eu fui notícia como 
artista pela primeira vez. 
Saiu uma nota no Diário de S. Paulo informando que o 
suplemento tinha um novo desenhista. 
Criei um personagem chamado Severino Espoleta 
e levei para avaliação do editor do suplemento, 
o jornalista Roberto Abrahão. Ele me recebeu em 
seu escritório sem eu ter que passar por secretária 
nem marcar hora. Ah, os belos e bons tempos em 
que um profissional era recebido como uma pessoa 
e não como um anexo de e-mail! Ele olhou os originais 
e falou que eu passaria a publicar duas páginas 
todo domingo. Acertamos o valor, ele tirou o 
dinheiro do bolso e me pagou. 



Nas primeiras publicações o Espoleta tinha o nome

“por extenso”, era Severino Espoleta. Ele era um
neto de cangaceiro. Ele até usava um chapéu de 
cangaceiro. Eu publiquei semanalmente por cerca 
de um ano. Eu era o segundo desenhista do 
suplemento. 



O primeiro era o Sergio Militello, que era responsável 

também por ilustrar as capas. As publicações nesse 
suplemento me abriram as portas da Editora Saber, 
da família Fittipaldi. Eu tinha 18 anos. Pela Saber lancei 
o gibi Turminha Sapeca. O líder da turminha era o Espoleta. 
Teve só um número. Cerca de um ano depois lancei o gibi 
Espoleta, pela Editora Noblet, tendo o nome do personagem 
principal como título. Eu tinha 19 anos. No gibi o Espoleta já 
não era mais neto de cangaceiro. Ele era apenas uma criança 
muito... espoleta, rs. E também tirei o Severino do nome do 
personagem, para simplificar.

TONY 12 : Quantos números da revista Espoleta 
você fez para a Noblet?

AVALONE: Eu cheguei a produzir cinco números, 
mas só quatro foram para as bancas.






TONY 13: Eu era jovem e desejava trabalhar
com as editoras Fazendo HQs e outras revistas. 
Jamais tinha ouvido falar da Noblet. 
Certo dia, eu estava no centro da cidade e ao 
passar por uma banca vi uma edição de Akim, 
em formatinho e lombada quadrada. 
Achei o personagem parecido com Tarzan, 
de Edgard Rice Burroughs, e como esta 
serie que eu colecionava tinha parado de 
sair pela EBAL acabei adquirindo Akim, 
mais por curiosidade. Mas, confesso que li e gostei.  
Lembro-me que comprei uma edição da revista Akim 
e nela vi um anúncio da revista do Espoleta... na
semana seguinte a comprei  e então 
descobri o nome do autor, um cara chamado 
Avalone. As HQs do Espoleta e da turma dele eram 
desenhadas em que formato, originalmente? 
A-3 ou A-4?


AVALONE: Os originais do Espoleta eram feitos 
no tamanho A-3. Falando do Akim, eu confesso 
que até hoje nunca li um número
sequer, mesmo tendo minhas HQs 
incluídas na revista. 
O Akim tem muitos fãs até hoje.

TONY14: O material era italiano... o Pedrazza não
era muito bom com as figuras humanas, mas
dava um show ao desenhar animais. Além disso
havia humor e aventura em boa dose em cada
edição... era legal. Você, sozinho, escrevia e 
desenhava a serie ou contava com colaboradores?

AVALONE: Era um trabalhos autoral. Sempre fiz tudo
sozinho. Criação dos personagens, roteiro, desenho,
 arte-final, letras, cores... 
As letras no Projeto Tiras foram feitas por letristas da Abril.
As do gibi Espoleta pelo Maldonado. Já as letras dos gibis do
Carrapicho são minhas. Até com filmes de desenho animado, 
minha diversão atual, faço tudo sozinho: personagens, roteiro, storyboard, animatic, rigging, animação e mixing. 
Se o volume de trabalho e o prazo me permitem fazer tudo, 
então eu faço. Claro que se um dia eu pegar um trabalho 
volumoso com prazo curto, 
se precisar de profissionais especializados, vou procurar 
e parcerias, não tenho nada contra. Até estou acostumado 
trabalhar em equipe. 
Na Abril e na MSP o trabalho era coletivo.

TONY 15: É ótimo aber que você está na ativa e fazendo
animações... muito legal. Que ferramentas você usava 
para artefinalizar suas páginas, na época? 
E, atualmente?

AVALONE: Na época do Espoleta eu desenhava à lápis 
e fazia a arte-final com uma peninha para nanquim 
chamada “mosquito” (não sei se é nome mesmo ou
gíria regional). 
Eu gostava dessa peninha porque era vendida em 
qualquer papelaria e era muito baratinha. 
O papel era o sulfite A-3.
Na produção do Carrapicho dez anos depois, eu usava 
papel schoeller e fazia o esboço com grafite azul, 
material de qualidade eu conheci na Abril. 
Também nessa época passei a finalizar 
com as canetas recarregáveis de nanquim, as Rotring. 
Apenas alguns anos depois, como ilustrador de livros 
didáticos na década de 90, eu conheci as canetinhas 
descartáveis de nanquin, que adotei por um bom tempo.
Aí passei a desenhar em sulfite A-4, mantendo ainda o 
esboço com grafite azul. Já no início dos anos 2000, 
com a onda de informatização, eu conheci o Photoshop 
e passei a desenhar digitalmente. O processo digital é 
o mesmo do papel, esboço em azul e finalização com 
traço preto ou colorido.


1987 - Depto de arte  do jornal A Tribuna




Publicado pela Noblet em 1987

TONY 16: Entendi... Comecei a colecionar Akim e Espoleta. 
Mas, de súbito, apesar da revista manter um bom nível, 
de repente, apareceu nela A Turma do Miúdo, de Paulo
Hamasaki... por quê você interrompeu a serie com
seus personagens?

AVALONE: Como eu disse numa resposta anterior, eu
cheguei a produzir cinco números do gibi Espoleta, 
só quatro foram para as bancas. Um mês depois, com 
surpresa, vi uma nova edição do gibi nas bancas. 
O título era meu, só que os personagens não eram 
os meus, nem na capa nem no miolo. O editor se
apoderou da minha revista, adicionando HQs do 
Paulo Hamasaki e do Sergio Militello. 
Esse é um assunto que eu nunca tinha 
publicado em detalhes, 
só fiz comentários superficiais até agora. 
Assim mesmo, só depois que li uma entrevista 
do Paulo Hamasaki em que ele narrou 
os fatos na versão que ele conhecia. Percebi que 
passaram para ele uma versão deturpada do ocorrido 
e resolvi esclarecer sempre que tivesse oportunidade, 
como essa entrevista.
Numa entrevista que o Paulo Hamasaki deu para você,
Tony, publicada aqui nesse mesmo blog em 25 de setem-
bro de 2011, ele fala: 
“No que refere a revista citada, Carlos Avalone, 
criador original dos personagens e do título da 
revista, ao desistir da mesma, passou-a para o 
Sérgio Militelo”. Não foi nada disso. Primeiro, eu 
não desisti da revista. Eu parei de fazer porque 
ganhava pouco pelo que a revista estava vendendo 
e o editor não aceitou renegociar os valores. 




TONY 17: Foi ótimo tocarmos no assunto... assim

tudo ficará claro. Olha só que interessante, eu
também conheci o saudoso Sérgio Militelo na
Noblet fazendo a revista de atividades infantis
do Godofredo nos anos 80 - minhas filhas
adoravam o personagem - ... mas não sabia que
ele tinha feito alguma edição para o título Espoleta, 
que era eu... Continue...

AVALONE: Se houvesse acordo, eu voltaria a fazer. 
Segundo: Eu não passei a revista para
o Sergio Militello, nem para o Paulo Hamasaki,
nem para ninguém. 
O editor se apropriou indevidamente do título e
entregou a revista para eles. 
Eu só fiquei sabendo quando vi a revista em bancas. 
Depois de muita insistência minha perante o editor, a 
revista parou alguns meses depois. 

TONY 18: Puta sacanagem... O Old Fox - apelido que eu

e o Hama colocamos no editor - era metido a esperto...
Parece que também nunca pagou royaties pelas
edições do Akim. O chefe não era fraco não. Tinha
sangue árabe e judeu nas veias... eu vivia imaginando
ele, gordo, sentado num camelo, vendendo kibes no
deserto... Rssss. Ele nunc deu mancada com a gente -
funcionários-, mas dava nó até em goteira... Dizia pra 
nós que tinha nascido no Egito, terra de Ali Babá e os 
40 Ladrões.... Rsss...

AVALONE: O editor alegou que parou de publicar 

para atender às minhas solicitações. Não é verdade. 
Parou porque não interessava mais, comercialmente. 
A explicação para isso o próprio Hamasaki esclarece,
 ainda nessa mesma entrevista: 
“Joseph Abourbih, o Publisher, mostrou-me os 
gráficos de venda: da tiragem inicial de 30 mil 
exemplares, acabamos em 13 mil”.

 Pode-se ver que quando a revista tinha o Espoleta,

as vendas eram altas. Eu lembro que o gráfico de 
vendas estava subindo a cada edição. 
Começou com 20 mil e no número quatro já
estava em 30 mil, como o próprio 
Hamasaki atesta.  Quando o Hamasaki fala em tiragem
inicial de 30 mil, certamente ele se refere ao momento
em que ele assumiu a revista, no número cinco. 
Com os personagens do Paulo Hamasaki e do Sergio 
Militello as vendas começaram a cair, começando a 
queda já no número seis, o segundo número em que
os personagens deles apareceram. 


Galera do Prtojeto Tiras - Editora Abril


Material promocional: Projeto Tiras

TONY 19: Entendi...

AVALONE: Daí em diante o gráfico foi uma ladeira abaixo. 
Hamasaki afirma ainda na entrevista: “A revista Espoleta 
durou exatos doze números, todas desenhadas e escritas
 por mim.” Não é verdade que os doze números foram 
escritos e desenhados pelo Hamasaki.
Eu escrevi e desenhei os quatro primeiros 
números. O Hamasaki nem estava na Noblet ainda. 
Ele foi apresentado à Noblet pelo 
Reinaldo de Oliveira, da editora Graúna, logo 
depois que eu parei de fazer o Espoleta. 

TONY 20: Confere, grande guru. Um dia o Hama me

disse que quem decolou o emprego pra ele na
Noblet foi noso querido e saldoso Reinaldão-
editor de Golden Guitar, O Homem Fera etc...

AVALONE: A Noblet estava procurando quadrinistas
para continuar a publicação sem mim. 
O Militello e o Hamasaki pegaram a revista do número 
cinco em diante. Como as vendas estavam acima dos 
30 mil exemplares quando eles pegaram e em oito
meses caíram para 13 mil, eu creio que se continuasse
publicação por mais dois ou três meses, entraria 
no vermelho. 

TONY 21: Com uma queda brusca daquela, com certeza,

estava dando prejuízo... o Old Fox sentou na man-
dioca... Rsss. Aqui s efaz, aqui se paga, segundo
o dito popular...

AVALONE: Meio que maldosamente eu adoro

pensar que as vendas caíram porque os leitores
queriam na revista o verdadeiro 
Espoleta, rsrs.

TONY 22: Essas coisas, infelizmente, acontecem...

e até que, por fim, ele lhe devolveu o direito do
título. Não foi tão mal... Foi uma pena porque você
podia ter dado sequência com a serie. A DC comprou
Superman por 130 dólares e deixou os autores na merda...
a Marvel se tornou dona de todas as criações
de Joe Simon, Kirby e Stan Lee, você sabe disso...
como podemos ver a sacanagem não rola só no
Brasil. Quando eu sai da Noblet, achei incrível, me
devolveram todos os originai e até os fotolitos,
acho que sob orientação do Hama, para evitar a 
treta que o  homem teve como no seu caso...
Esses gringos veem ao Brasil e aqui se tornam
importantes, mas na terra deles nem sonhavam
em ser editores. No Egito, o chefe era vendedor de
anúncio, mas se dizia "piblicitário". Rsss... a gente
tirava um sarro. Não tinha experiência no ramo...
entrou e se deu bem, durante anos.

AVALONE: Naquela época eu era sonhador e
profissionalmente imaturo, não entendia nada
de marcas e patentes, nem de direito autoral ou
patrimonial, por isso fui enrolado pelo editor. 
Se fosse hoje... Mas eu confesso que não tenho
nenhuma mágoa com o dono da Noblet, o
Sr. Joseph Abourbih, muito pelo contrário. 
Exceto pelo fato de que ele agiu indevidamente 
comigo no caso do Espoleta, ele abriu a porta 
do mercado para muitos quadrinistas. 
E vários se firmaram depois graças a essa abertura,
inclusive eu. E também não tenho nenhuma mágoa 
do Militello nem com o Hamasaki, de jeito nenhum. 
Eles apenas ocuparam um espaço que ficou livre, 
o que é absolutamente normal no mercado. 
Eles não tinham nada a ver com os meus 
desentendimentos com o editor. 
Eu saí, eles entraram.


TONY 23: Na minha opinião, ambos eram inexperientes
no ramo, você e ele. É assim mesmo, a gente entra na
área, também sem saber como a coisa funciona e
vamos aprendendo com o tempo. Apesar de ser
ligeiro nos negócios o homem não era má pessoa e,
de fato, adorava HQs e deu oportunidade para muitos,
assim como eu, o Hamasaki, Décio Ramirez, Salatiel de
Holanda, Primaggio, Cortez, Reinaldo de Oliveira,
Fausto Kataoka, Militelo, J.B. Pereira, Hélio Porto,
Eugênia Cécilia Brasiliense, Marcos e Dolores
Maldonado, Sátiro, Pace, Wilson Hisamoto, 
Dafne Rodrigues, Toninho Duarte e você.
Prosseguindo... 
Você já conhecia o Paulo? 
Se dava bem com ele?

AVALONE: Eu conhecia o Paulo apenas de encontros 
ocasionais, geralmente ligados a trabalho. Lamento não
ter desenvolvido uma amizade mais ampla com ele. 
Com certeza nossas conversas iriam agregar muita 
informação útil ao meu desenvolvimento profissional.








TONY 24: O Hama era um cara super experiente, além
de um grande desenhista e roteirista. Convivi durante
5 anos com ele, na Noblet. Aprendi muito com ele. Era
um grande intelectual. Segundo meus espiões, você
trabalhou na Abril, OK? Como surgiu a oportunidade? 
Em que ano foi e que função 
você exercia lá?

AVALONE: Bem, eu não lembro os anos exatos. Sempre fui 
ruim com datas e números, mesmo quando esses não são 
uma equação matemática. Eu memorizo bem os fatos, mas 
não as datas. Mesmo sem citar datas, às vezes me perco 
até na ordem cronológica, digo que um fato aconteceu antes
quando aconteceu depois, KKK...  Eu tive duas fases distintas 
na Abril. A primeira foi na época da Faria Lima, como frila em 
desenho e arte final Disney. A segunda foi na época da Bela 
Cintra, como desenhista contratado no Estúdio Capas. 
Entre uma fase e outra eu trabalhei no estúdio do Ruy Perotti.


TONY 25: Grande Perotti... Adorava Satanésio, criado por ele,

que saiu inicialmente na revista CRÀS e depois em edição 
solo. Ele também foi o criador do Sugismundo...






AVALONE: Bem, vamos à primeira fase... Nesse caso 
quem me apresentou ao Jorge Kato, um dos diretores
do setor, foi o Edmundo Rodrigues. Eu, ainda fazendo
o Espoleta, estava na redação do Diário de S. Paulo e
o editor me falou que o desenhista Edmundo Rodrigues 
tinha vindo do Rio tratar algo com os Diários Associados 
(dona do Diário de S. Paulo). O editor me sugeriu procurá-lo
e tentar cavar algum trabalho tipo 
assistente-de-qualquer-coisa.

TONY 26: O grande Edmundo Rodrigues... esta eu também

não podia imaginar... prossiga, vamos nessa...

AVALONE: Eu não tinha em mãos nenhum original meu para
mostrar. Fui ao arquivo do Diário e surrupiei um 
exemplar do Clubinho. Puxei conversa com o
Edmundo e mostrei o jornalzinho com meus 
desenhos. Ele falou que minha tendência 
para desenho puxava para o infantil estilizado. 
Então me falou para ir à Abril Infantis na Faria
Lima e falar com Jorge Kato. 
Eu fui no dia seguinte, o Jorge me aceitou e logo 
passei a fazer parte da turma de frilas que desenhava 
e/ou finalizava quadrinhos Disney. 
Eu era subordinado ao Jorge Kato e ao
Primaggio Mantovi, eles dois chefiavam 
conjuntamente o setor. 

TONY 27: O Edmundo, mais uma vez demonstrou mais

uma vez sua generosidade.  Ajudou muita gente. Foi um
cara bacana...  Primaggio e o mestre Kato - este último foi 
o mentor da lendária Escolinha Disney. Os dois são monstros sagrados do setor 
editorial nacional. 

AVALONE: Bem, vamos à segunda fase, na Abril da rua

Bela Cintra. Nesse caso quem me apresentou ao Izomar
Camargo, diretor de arte no Estúdio Capas, foi o Ruy
Perotti. Eu nem lembro direito por que abandonei Disney, 
mas não fui dispensado como na Start, rsrs... Só sei 
que, de repente, eu estava trabalhando no estúdio do 
Perotti. Eu pulava muito de galho em galho, não 
esquentava o assento em lugar nenhum. 
O estúdio do Perotti era na Tabapuã. 


Perotti
TONY 28: Izomar, foi um grande desenhista. 
Também conheci o fera na Abril... Ruy Perotti, ele eu
não conheci pessoalm ente. Quanta gente
boa estamos relembrando... é pena que muitos
se foram...

AVALONE: Ali eu desenhava e finalizava HQs do 

Gabola e do Satanésio, personagens do Perotti
que tinham revistas publicadas pela Abril. Pouca
gente sabe, mas além de desenhar e finalizar esses
personagens, eu escrevi alguns roteiros para Gabola
e Satanésio. 
Teve história do Gabola que eu escrevi o roteiro, 
desenhei e artefinalizei. Eu nunca falei muito isso 
porque, como eu não assinava as histórias, 
não gostava de falar o que fiz. Letras, balões e 
cores eram feitas na Abril. Um dia chegou para 
trabalhar lá um jovem iniciante estreando 
na profissão, o Airon, que é hoje um renomado
cartunista. 
O Perotti fazia também desenho animado, 
mas assim como na época da Start Filmes, 
eu nunca me interessei. 
Meu foco era quadrinhos.

TONY 29: Gabola... putz. Tinha me esquecido desse

personagem. Foi bom lembrá-lo... você escrevendo e
desenhando Satanésio e Gabola... você, mais uma
vez me surpreendeu. Genial, parabéns grande guru!
O jovem Airon, de súbito, pintou no pedaço... sou
fã dele, apesar de não conhecê-lo pessoalmente. 
Conheci o irmãos dele, os cartunistas, Jorge e Verde... 

AVALONE: Algum tempo depois o Perotti ia desativar o 

estúdio e cada um tomou seu rumo. Por coincidência 
o Izomar Camargo, do Estúdio Capas da Abril, procurava
um artista para preencher uma vaga no departamento.
Mas ele não queria alguém que fizesse apenas desenho 
ou apenas arte final. Queria alguém capaz de desenhar, 
de finalizar a ainda por cima criar capas, compor cenas
engraçadas em uma única imagem. Como eu dava dicas 
de capas para Satanésio e Gabola,  O Perotti viu em 
mim esse perfil e me indicou ao Izomar. Assim eu 
me tornei funcionário registrado da Abril e fiquei 
no Estúdio Capas por nove anos.






TONY 30: Meu querido bengala brother (gente de idade
com espírito jovem), você tem uma bagagem profissional
imensa, fantástica. Vamos nessa...
Meus espiões também garantiram que você 
trabalhou na Mauricio de Sousa Produções. 
Como conheceu o Mauricio? Em que ano você 
começou a trabalhar lá? Quanto tempo ficou e
 o que você fazia?

AVALONE: Eu conheci o Mauricio em 1971, alguns 
anos antes de trabalhar no estúdio dele. 
Eu tinha sido demitido da Start Filmes 
(hoje Start Anima), sonhava trabalhar com 
quadrinhos mas ainda não tinha publicado nada. 
Nem tinha publicado o Espoleta ainda no
suplemento Clubinho, o que viria a acontecer
 apenas no ano seguinte. 
Conheci o Mauricio pessoalmente por causa de 
um fanzine. Como todo apaixonado por quadrinhos,
eu procurava meios de ter contato com esse universo, 
muito além da simples leitura dos gibis. 
Um dia conheci, naquelas notícias que vinham na 
contracapa dos gibis da Ebal (acho que o nome da 
seção era Notícias em Quadrinhos), 
um fanzine mimeografado produzido em Salvador, 
chamado Na Era dos Quadrinhos.

 Era editado pelo jovem Gutemberg Cruz Andrade,

 que depois veio a ser jornalista no jornal A Tarde, 
de Salvador. 
Eu fiz uma assinatura mensal do fanzine, recebia 
pelo correio uma vez por mês. De vez em quando 
eu até colaborava com o fanzine, cavando fontes
de matérias em São Paulo e enviava para o Gutemberg. 
Um dia liguei para a MSP e pedi uma entrevista com 
o Mauricio, para publicar no fanzine. 

Para minha surpresa a entrevista foi marcada para 

o dia seguinte. Eu levei um gravador de fita cassete, 
o Mauricio gravou a entrevista sentado à minha frente. 
Eu transcrevi a gravação para texto e enviei para o 
Gutemberg, que a publicou na edição seguinte. 
Aliás, se o Gutemberg ainda tiver essa edição, 
eu gostaria de receber uma cópia ou umas fotos. 
Em 1975, depois que eu já tinha publicado o 
Espoleta no Clubinho, na Saber e na Noblet, fui à MSP 
pedir emprego. O estúdio naquela época ficava em um 
“puxadinho” do prédio da Folha de S. Paulo, na 
Conselheiro Nébias. Ainda era possível chegar lá 
e ser recebido pelo próprio Maurício. 
No dia seguinte eu era mais um dos 30 componentes 
da equipe de artistas da MSP. Fiquei quase um ano, 
com carteira registrada. Desenhei HQs e tiras de 
vários personagens, mas eu comecei desenhando 
Jotalhão e outros personagens mais secundários. 






Demorou algum tempinho até eu desenhar os principais, 

como a Mônica e o Cebolinha. Mas esses personagens 
eu desenhei muito pouco, pois ficavam com os 
melhores desenhistas, principalmente com o Sidnei 
Losano Salustre. Nas primeiras semanas eu passava 
horas desenhando uma única página, com todo cuidado. 
O Mauricio chegava, dava uma olhada na minha página,
apagava tudo e a refazia em segundos, explicando 
onde eu tinha que melhorar. Recentemente escrevi 
um post no Facebook bem curioso falando como 
era a assinatura do Mauricio na carteira de trabalho 
dos funcionários. Está aqui nesse link: 
http://bit.ly/2oMmHwa


TONY 31: Parece que atualmente você mora 
no litoral paulista... Em que bairro?

AVALONE: Eu moro em Santos, no bairro Embaré, 
há mais de trinta anos. Vim para cá em 1985. 
Sair de São Paulo e vir morar em Santos foi a melhor 
coisa que fiz em termos de mudança de qualidade de vida, principalmente para meus filhos que eram bem crianças. 
Eu continuo gostando de São Paulo, vou sempre lá 
mas só para visitar, participar de eventos, ir a shows etc. 
Para morar, não. Estou meio sem paciência para o 
caos urbano, rs.







TONY 32: Muita praia e sol, isto faz um bem danado...
O Mauricio acabou virando uma empresa familiar. 
O falecido e genial Márcio e a Maura, ambos irmãos do
 dono, também trabalhavam na empresa. 
Você se dava bem com eles?

AVALONE: Eu nunca tive um relacionamento próximo 
com o Marcio e a Maura, era meio distante, meio profissional. 
O Márcio era muito brincalhão e bem humorado. 
Ele era um artista bem versátil e talentoso. 
Maura era mais séria, mais tecnocrata, porém simpática 
com todos. Eles não conviviam muito com os artistas, 
não frequentavam muito o estúdio, apareciam para tratar algo 
e saiam, ficavam mais na área deles.

TONY 33: Você chegou a conhecer Alice Takeda, a 
segunda mulher do Mauricio?

AVALONE: Não só conheci a Alice como acompanhei 
toda a evolução do envolvimento entre ela e o Mauricio, 
dentro dos limites da nossa convivência no estúdio. 
Em um dado tempo começaram a correr rumores de 
que as conversas entre o Mauricio e a Alice estavam 
saindo da formalidade profissional e ficando, digamos, 
um pouco mais descontraídas, embora essa descontração 
fosse bastante sutil. Mas até então eram apenas rumores
e suposições. Um dia, o Mauricio estava no Japão 
tratando de merchandising do Horácio.




Entrou no estúdio um funcionário do administrativo e 

conversou baixinho com a Alice. Ela pega as coisas 
dela e sai. Percebemos que ela não voltaria mais 
naquele dia, mas ainda não sabíamos o motivo. 
Pouco depois soubemos que o Mauricio telefonou do
Japão e informou que estava enviando passagens para 
a Alice ir se encontrar com ele lá. Sabendo que eles já 
estavam próximos afetivamente e que agora ela iria 
participar das reuniões importantes da empresa, 
aí sim concluímos que a Alice se tornaria 
a esposa do Mauricio. 
Meus desenhos animados, que rodaram o mundo em festivais, 
estão disponíveis no Vimeo:http://bit.ly/2o7Tk2P  O Bola de 
Trapos estará disponível online em 2018, atualmente ainda 
está rodando o circuito dos festivais.



1975 - MSP - Com Alice Takeda (de blusa listrada) e a turma

TONY 34: Na época que esteve na MSP, quem escrevia 
a maioria  dos roteiros para a Turma da Mônica e 
quem era o melhor desenhista da equipe?

AVALONE:  Os roteiristas na minha época eram o 
próprio Mauricio, o Paulo Paiva, o Paulo Munhoz, 
o Reinaldo Waismann e o Márcio, irmão do Mauricio. 
Tirando o Maurício, que não conta, rsrs, os outros 
tinham qualidade similar nos roteiros. 
O Reinaldo não trabalhava no estúdio junto com
a gente, tinha uma sala separada junto com o Márcio, 
onde havia instalações mais confortáveis. 
Daí pode-se supor que o Mauricio dava especial 
atenção aos roteiros do Reinaldo. 

Quanto a melhor desenhista,  vou falar baseado na 

minha própria preferência, o que não é determinante. 
O melhores na minha época – na minha opinião - 
eram o José Claudino Gomes e o Sidnei Losano
Salustre, pela desenvoltura com que desenhavam 
e pelo resultado belíssimo já no lápis. 
Minha prancheta era bem entre as deles, o Sidnei
ao meu lado direito e o Claudino ao meu lado 
esquerdo. Que pena que talento não é contagioso!
Rsrs... Depois chegou o José Márcio Nicolosi, 
que começou desenhando para produtos de 
merchandising. Em pouco tempo o Zé Márcio 
passou a desenhar as HQs e se tornou também 
um dos melhores. 

Ele foi um dos  primeiros a introduzir um 

estilo inovador ao visual tradicional do Mauricio. 
Isso é uma coisa legal do Mauricio, ele sempre 
aceitou inovações e releituras dos personagens dele. 
Ele nunca “engessou” o desenhista, deixava se 
soltar no estilo, desde que não deturpasse o 
personagem. Vários outros desenhistas também 
inovaram nas últimas décadas.

Naquela época o Mauricio tinha uma prancheta

junto com a equipe de desenhistas.
Ele se ausentava toda a parte da manhã, 
porque era o período do dia em que fazia 
as reuniões e contatos de merchandising, nas
empresas ou no escritório. Geralmente ele chegava 
pelas três da tarde, sentava à prancheta no meio
da gente e desenhava. Por várias vezes eu o
vi desenhando uma HQ do Horácio e no 
mês seguinte via a HQ na revista. 

Eu nunca o vi seguindo um roteiro. 

Ele chegava com a história na cabeça, 
sentava e desenhava direto, com
balões e tudo. 
A gente estava ao lado da prancheta dele, 
ele ali desenhando e a gente nem ligava, 
era muito normal, uma rotina de trabalho. 
Muitos fãs da Mônica pagariam para ter 
vivido um momento como esse.


 TONY 35: em dúvida... Quem era o diretor de arte?

AVALONE: Na MSP o diretor de arte de fato, que dava 
a palavra final, era o próprio Mauricio. Mas quem 
primeiro revisava nossos desenhos era o chefe 
de arte Sidnei Losano Salustre. O José Claudino 
Gomes às vezes ajudava na revisão dos desenhos, 
antes de irem para a aprovação do Mauricio.

Tony 36: Eu também já colaborei com a Abril, mas 
todos que trabalharam com eles, que criavam e 
desenhavam suas próprias HQs, sonhavam em
 publicar com eles um dia. Mas, os caras queriam 
a gente para desenhar patos etc. Confesso que 
sai de lá meio frustrado, E você?

AVALONE: Eu nunca saí frustrado de nenhuma 
editora ou estúdio em que trabalhei como funcionário. 
Trabalhar em uma grande editora ou em um grande 
estúdio era a melhor opção para quem queria 
desenhar quadrinhos e não conseguia editora 
para publicar como autor. Mas eu entendo sua
colocação. É verdade que uns poucos ali não 
gostariam de estar ali. Esses poucos tinham 
veia de autor e queriam fazer seus próprios 
personagens e não ficar desenhando os
personagens de outro autor. 

Eu sempre tive veia de autor, mas também sempre

entendi que há fases em que o melhor é pousar em 
um estúdio ou editora, até sentir o momento de 
decolar de novo. Tanto na MSP quanto na Abril, 
quando eu senti que era o momento de decolar, 
eu pedia demissão. Era raro alguém pedir demissão
dessas empresas. Quando isso acontecia todos 
ficavam surpresos porque o salário era bom, o 
ambiente de trabalho também e de uma certa forma 
todos trabalhavam com o que amavam, desenhando 
quadrinhos. Tanto na MSP quanto na Abril é comum 
ter artistas com 30, 40, ou mais anos de casa. 
E muitos aposentavam ou vão se aposentar
na empresa. 

Quem pedia demissão era porque tinha projetos 

profissionais mais ambiciosos. Ou tinha veia de autor 
e sentia que chegou o momento de sair voando por aí. 
Se não fosse assim, eu também ficaria com carteira 
registrada até aposentar, não vejo nenhum problema 
nisso. Mas o autor nato, aquele que se sente inquieto 
pelo desejo de publicar sua própria obra, não se 
aposenta pela CLT. Esse sou eu.

TONY 37: Somos nós... Rsss. acho que somos malucos
mesmo - no bom sentido.  A Abril sempre tratou bem
seus funcionários, sem falar dos pagamentos, que 
também sempre foram superiores das demais casas
editoriais. Sair de uma empresa como ela e ter que
encarar os preços e as condições dos editores pequenos
É um choque. Depois que você deixou a Abril, foi difícil 
se adaptar aos preços das pequenas editoras?

AVALONE: Baseado-se na minha própria experiência 
posso afirmar que a Abril e a Mauricio de Sousa 
Produções sempre trataram muito bem seus 
funcionários e seus colaboradores externos. 
E também sempre tiveram a faixa salarial mais 
alta do mercado no ramo dos quadrinhos. 
Quando saí da Abril, já morando em Santos 
(eu subia e descia a serra todos os dias durante 
os dois últimos anos, em ônibus fretado), 
eu fui trabalhar no departamento de artes do 
jornal A Tribuna, daqui de Santos. Adivinha... 
pedi demissão com apenas dois meses 
de casa, rs...

A veia de autor é inquieta! Aí comecei a desenvolver o 

projeto do Carrapicho, que foi lançado alguns meses
depois pela Editora Noblet. A Noblet me pagava pelo 
Carrapicho quase o mesmo que eu ganhava na Abril, 
com a condição de não assinarmos contrato. 
O Sr. Joseph tinha alergia a contratos, rs... Eu abri 
mão do contrato porque o pagamento era bom e em 
dia e eu estava esperto: dessa vez eu tinha 
registrado o título Carrapicho no INPI. 




Se ele não me pagasse, eu não entregaria os originais 

e ele não teria como se apoderar do título da revista,
como fez doze anos atrás com o Espoleta. 
Depois que o Carrapicho deixou de ser publicado
eu não senti dificuldade com relação aos preços
de outras editoras porque saí da área de quadrinhos
e fui para a didática. Por uma dica do Izomar eu fui 
à Editora Ática, onde comecei minha fase de ilustrador. 
Eu não gostava muito de ilustrar didáticos, 
gostava mesmo de quadrinhos.

Porém, mais uma vez, entendi que era hora de

pousar e aguardar ventos melhores para decolar
de novo como autor. Além da Atica, passei a ilustrar 
para as editoras FTD, Scipione, Saraiva, Moderna, 
Brasil, Macmillan, etc. Durante alguns anos ilustrei
também para editoras dos Estado Unidos e 
da Inglaterra. As ilustrações didáticas naquela 
época, fim dos anos 80, tinham uma faixa de
preço até, em média, cinco vezes maior que 
a dos quadrinhos. 

TONY 38: Bons tempos aqueles...



AVALONE: Foi a época da minha vida em que 

eu mais ganhei dinheiro como desenhista. 
Os preços eram, em muitos casos, melhores
até do que os do mercado publicitário, considerando
que o trabalho era ilustração de livre criação com
pouquíssimo retorno para correção. 
E a técnica o artista escolhia, 
podendo assim fazer naquela em que fosse mais 
rápido, aumentando seu faturamento. E quando uma 
editora me chamava para ilustrar, era uma coleção de
quatro volumes ou mais, com centenas de ilustrações.
Eu tinha trabalho garantido e bem pago por vários 
meses consecutivos. Era comum eu pegar trabalhos
para oito ou dez meses e ganhando bem. 
Um trabalho muito mais moleza do que o 
publicitário e com preço similar! 

À partir de 2010 os preços da ilustração didática caíram 

feio. Mas aí eu não me incomodei. Fazendo ilustração 
didática por mais de quinze anos eu já tinha garantido 
uma certa segurança para o meu futuro. E eu já tinha 
planos para o futuro, dos quais a ilustração didática 
não fazia parte. Assim, eu não passei pelos preços 
baixos das pequenas editoras depois 
que saí da Abril. 
Eu gosto de brincar dizendo que minha relação 
com a ilustração didática foi como um casamento 
por interesse: não havia amor, mas a grana era boa.


TONY 39: "Casamento por interesse", esta foi boa
Rsss... Eu me lembro bem que na Abril a turma 
trabalhava em linha de montagem: Um traduzia ou 
escrevia, outro fazia o lápis, outro artefinalizava, 
um coloria, outro desenhava os balões e as letras
e tinha até gente especializada em desenhar títulos 
e fazer decorados (completar desenhos, quando o
formato da edição era diferente do formato brasileiro). 
Achava aquilo um absurdo: Uma porrada de profis-
sionais para fazer uma edição de 32 págs. 
Acontece que por estar viciado em trabalhar
daquele jeito muitos profissionais 
quando deixavam a Abril se davam mal com as 
pequenas editoras, que sempre exigiam que o 
artista entregasse o trabalho pronto, exceto, letrerado. 
Geralmente, nós, desenhistas, somos péssimos 
letristas. Daí o valor dos Maldonados (Marcos e Dolores)
que sempre acabavam dando uma força pra gente
letrerando nossas criações. Sem aquela dupla
estávamos lascados - eu, ao meno, sei que estava.
Rssss... 
Você também teve problema ao sair e encarar o
mercado dos pequenos editores? 
Ou sabia fazer tudo e se deu bem?


AVALONE: É verdade, Tony. Muitos desenhistas de 
editora ou de estúdio eram bons no que faziam, mas 
não faziam uma HQ completa, desde a criação do 
personagem, passando por roteiro, lápis, arte final, 
letras e cores. Como você disse, as pequenas editoras 
queriam o trabalho pronto, tudo feito pelo próprio autor, 
não queriam montar uma equipe. Eu sempre me dei bem 
com pequenas editoras porque eu fazia tudo, entregava
os originais prontos para irem para a gráfica. 
Mas em muitos casos os autores não podiam
prescindir de especialistas em outras fases
da produção de uma HQ.


Tony 40: Exatamente... Voltando a falar do Mauricio... 
O mestre Jayme Cortez terminou seus dias trabalhando
como diretor de animação, se não me engano, da MSP.
Você conheceu ou conviveu com o Cortez naquele período?

AVALONE: Eu não cheguei a conviver com o Cortez na MSP. 
Eu estava saindo e ele chegando. Mas ouvi dizer que ele 
tinha talento para ficar com a minha vaga. KKK...

Tony 41: Piadista... Ygaiara, Jorge Kato, Izomar, este pessoal 
também foi pioneiro em fazer HQs no nosso mercado 
editorial. Começaram nas pequenas editoras e depois 
entraram para a Abril, onde ocuparam cargos importantes. 
Você tinha um bom relacionamento com eles?

AVALONE: Com o Ygaiara e o Kato minha relação foi 
meio distante, departamentos em andares diferentes. 
Com o Izomar, até hoje temos uma boa amizade, 
conversamos frequentemente por telefone, falamos 
muitas abobrinhas e damos muitas risadas, como sempre.
Trabalhar no Estúdio Capas, do Izomar, era o sonho 
de muitos desenhistas de outros departamentos da 
Abril Infantis porque era o mais descontraído. 
Essa descontração se devia muito ao fato do Izomar 
ser muito mais amigo da turma do que chefe. Mas era 
um bom chefe também no sentido profissional, sabia 
conduzir o departamento com firmeza quando 
precisava, embora raramente precisasse, uma vez 
que a equipe cumpria muito bem sua função. 

Tony 42: Há séculos não vejo o Izomar...


AVALONE: Naquele período teve o Projeto Tiras,

que deu um pouco de asas aos autores da casa. 
Além disso, os artistas da casa podiam publicar
trabalhos autorais na Crás, na Pancada, na Recreio. 
Isso aliviava nossa veia de autor.
Talvez por isso eu tenha ficado nove anos lá. 
Nove anos que passaram rápido! Já que citei o 
Projeto Tiras, vou aproveitar o gancho e registrar 
aqui alguns detalhes. Foi uma empreitada única na 
história da HQ no Brasil. A Abril montou um ousado 
e ambicioso sistema de distribuição de tiras diárias 
para jornais de todo o país, com participação 
majoritária de quadrinistas ligados à editora, dirigido 
por Ruy Perotti e coordenado por Wagner Augusto. 
Tendo 11 autores e um editor, nunca tinha sido feito 
nada parecido no Brasil até então. 

TONY 43: Me lembro bem disso, apesar de na época

ser funcionário da Noblet... 

AVALONE: O desafio era instituir um sistema comercial 

de produção e distribuição de tiras semelhante ao
americano, um King Features Syndicate tropical,
com o suporte da poderosa Editora Abril. 
Dentro desse Projeto eu criei as tiras do 
Carrapicho que foram publicadas diariamente por 
dezenas de jornais de todo o país durante mais de um ano. 
Os participantes do Projeto Tiras e seus respectivos 
personagens foram: Izomar Camargo (Zé Pessimista), 
Henrique Farias e Paulo Paiva (Giba), Claudino e
Paulo Paiva (Inseto City), Renato Canini (Tibica), 
Paulo José (Bingo), os irmãos Airon e Marcelo “Verde” 
Lacerda (O Saturniano), Jorge Kato (Tuca), Clóvis Vieira 
(Strego), Guy Lebrun (A Turma da Bola), Primaggio 
Mantovi, (O Veterinário) e eu com o cangaceiro
Carrapicho. 

Com a mudança de diretores na Abril, o Projeto

 Tiras foi desativado. Os novos diretores
não entenderam a importância das tiras 
de quadrinhos, 
que poderiam alavancar as vendas de revistas. 
É o problema de colocar diretor por indicação e 
não por capacitação. Eu ouvi falar de diretor 
indicado que afirmava na maior cara dura que 
não lia quadrinhos. E era diretor numa editora 
de quadrinhos!


A  galera do projeto tiras

Tony 44: Interromper o projeto tiras foi lamentável...
Inácio Justo, Nico Rosso, Getúlio Delphim, 
Lírio Aragão, Gedeone, Lucchetti, Edno e Edmundo 
Rodrigues, Walmir Amaral, também foram pioneiros. 
Você conheceu pessoalmente alguns desta turma?

AVALONE: Infelizmente não conheci todos dessa turma, 
é uma pena. Só tive um contato breve com o Edmundo 
Rodrigues, conforme contei na pergunta 9.

Tony 45: Houve um tempo em que até dava para 
sobreviver fazendo quadrinhos. Nas décadas de 60 
e 70 tinha muitos títulos nacionais nas bancas 
(inclusive de terror) que, aos poucos, foram 
desaparecendo. Na sua opinião, faltava qualidade 
nos roteiros dos quadrinistas da época? 
Afinal, tinha - e ainda temos - muita gente boa
de traço.


AVALONE: É verdade, foi possível viver só de 
quadrinhos por algumas décadas. Eu tive a felicidade 
de pegar as duas últimas décadas dessa era de ouro. 
Eu penso que nunca faltou qualidade nem nos roteiros
nem nos desenhos. O que aconteceu no Brasil 
aconteceu no mundo todo. Os quadrinhos passaram 
a compartilhar o mercado com outros atrativos, 
principalmente os advindos da evolução tecnológica 
de lazer, de informação e de comunicação. 
Claro que me refiro aos games, às redes sociais 
e à internet como veículo de informação e cultura. 
Além disso, as crianças e os jovens se libertaram 
mais, ocupando boa parte do seu tempo de lazer 
em outras atividades que até então não faziam parte 
da sua rotina. Sobreviveram melhor os quadrinhos 
que tinham um suporte paralelo em filmes e 
merchandising. 

O maior faturamento da turma da Mônica está no 

merchandising, não nos quadrinhos. Já na área de 
super heróis eu vejo uma curiosidade. Na década de 
60 os quadrinhos eram um grande sucesso, mas os 
filmes não iam bem. 

O que atraía público para os cinemas eram os 

quadrinhos. Hoje é diferente,  os filmes reforçam a
atração pelos quadrinhos e vice-versa, os dois 
se ajudam. A decadência das HQs, 
salvo algumas exceções, nem tem a ver com o 
consciente coletivo. Bolinha e Luluzinha estão no 
consciente coletivo da nossa geração, mas os
quadrinhos não vendem. Se Bolinha e Luluzinha 
tivessem construído uma estrutura de merchandising 
da década de 60 até hoje, poderiam ter gibis vendendo 
com o apoio do merchandising e vice versa, como é 
o caso da Turma da Mônica. Para o autor não basta 
ser artista, tem que ser empreendedor também. 
Falando em suporte, lembrei de um caso que não
tem a ver com merchandising, mas vou citar porque 
envolve HQs. A revista Veja no início dava um baita 
prejuízo, mas o Victor Civita acreditava na revista. 
O gibi Tio Patinhas dava um baita lucro. Então o 
Victor Civita usou o lucro do Tio Patinhas para 
sustentar a Veja durante algum tempo, até que 
essa entrasse no azul. É curioso saber que a 
revista Veja existe hoje principalmente graças 
ao capital vindo das HQs.

Tony 46: Perfeito... Com a enxurrada de títulos de super-heróis 
que entrou no mercado a partir dos anos 60, muitas 
edições boas de farwest deixaram de circular. 
Hoje, só sobrou Tex. A que você atribui esta longevidade
do cowboy da Bonelli?

AVALONE: No caso do faroeste eu não tenho 
conhecimento a ponto de poder opinar. Vou dar 
apenas meu pitaco, como se estivéssemos em um 
papo de boteco depois de algumas (ou muitas) cervejas. 

TONY 47: Até me deu água na boca... faltaram as

brejas gelada, grande guru... Rssss. 

AVALONE: Os especialistas em faroeste fiquem

à vontade para me corrigir. Eu creio que seja também 
um caso de suportes simultâneos.
Haja visto que a época de ouro das HQs de
faroeste combina com a do cinema. 
À medida que o cinema de faroeste foi retraindo, os 
quadrinhos seguiram junto. Quanto ao Tex ele tem 
um nicho específico e fiel que adora o gênero e, 
especificamente, o personagem. Há vários outros 
personagens que têm nichos permanentes e fiéis 
que sustentam a sua existência, independente das 
oscilações do mercado. Além disso, o gênero faroeste 
nunca teve um mercado de merchandising como 
sempre tiveram os super heróis e os infantis.

Tony 48: Gostei da sua análise... Quais eram seus
personagens dos gibis favoritos durante sua
infância ou adolescência?

AVALONE: Não dá para citar os meus títulos preferidos. 
Eram muitos, muitos. E era tudo bem barato, acessível 
em bancas. Miolo de papel simples e capa de papel simples.
Muitos eu lia e depois dava para os amigos e também 
ganhava muitos deles, porque eram baratos. 
As edições encadernadas ou de capa dura eram raras.
Havia HQs com mais de 30 páginas, mas o mais comum
era o gibi com duas ou mais histórias curtas na
mesma edição. 
Na minha infância e adolescência a gente nem precisava 
comprar todos os gibis, tendo alguns já podia ler todos, 
bastava emprestar e pegar emprestado, ou trocar na 
porta do cinema na matinê de domingo.
Atualmente, tirando Mônica e Disney, não há nenhum 
sucesso sólido em quadrinhos infantis. 

De vez em quando um personagem faz um sucesso

relativo. Aí o autor se esforça para faturar o máximo
possível em merchandising porque sabe que esse 
sucesso é temporário.
Mesmo os super heróis, para sobreviver, estão sempre 
mudando, trocando de roupa, inovando, adicionando 
novos personagens protagonistas ou antagonistas. 

Poucos têm vida longa com o mesma visual, como 

era no passado. Eu tenho a impressão que na década 
de 60 havia mais títulos infantis do que de super-heróis 
e eu gostava de todos. 
Eu gostaria de poder comprar e ler muitas dessas graphic 
novels disponíveis atualmente, sejam de editoras ou de 
independentes. 
Mas não posso. Eu sinto isso em feiras de HQs. 
Há duzentos títulos disponíveis, eu gosto de muitos e 
gostaria de comprar, mas eu tenho que ser bem seletivo. 
Hoje predominam as graphics novels com uma história 
fechada de 80 ou mais páginas. São publicações menos 
acessíveis do que os baratos gibis mensais de bancas 
do passado recente. E não há mais como “amortizar 
o investimento” fazendo trocas na porta do cinema.

Tony 49: É fato, grande guru. A brincadeira ficou
seletiva, cara de mais.... Além de Espoleta, você
também criou e 
publicou outras series infantis?

AVALONE: Em 1987, mesmo ano em que saí da Abril 
Infantis, lancei o gibi do Carrapicho pela editora Noblet, 
a mesma que tinha aprontado com o meu Espoleta treze 
anos antes. Mas dessa vez eu estava esperto. 
O título Carrapicho já estava registrado no meu nome. 
Esse personagem eu tinha publicado antes, em 1979, 
através do Projeto Tiras da Editora Abril. 

Mas, novamente, não dei sorte com a Noblet. 

A revista parou no número 4, mesmo com uma 
tiragem de 32 mil exemplares. O problema foi que 
a revista era distribuída pela DINAP, empresa do 
Grupo Abril naquela época. Um dia, numa reunião em 
que estavam o editor Sr. Joseph, um representante 
da DINAP e eu, o representante falou: não vamos mais 
distribuir o Carrapicho. Como assim?, indaguei. 
Segundo o representante, uma orientação enviada da
diretoria da Abril Infantis para a diretoria da DINAP 
recomendava não distribuir. Como a DINAP era do 
grupo Abril, a recomendação foi acatada.




 Fatores determinantes, segundo falou o representante, 

eram que o Carrapicho era de um desenhista recém-saído 
da Abril, era uma publicação concorrente que tomava 
espaço de outras revistas similares da editora, 
tinha o mesmo formato e a mesma linha editorial e, 
ainda por cima, era um personagem que tinha sido
lançado, divulgado e distribuído recentemente pelo 
Projeto Tiras da Abril. Era “fogo amigo” .

No dia seguinte eu sugeri ao Sr. Joseph mudar

de distribuidora, ir para a Chinaglia. Ele não 
concordou porque considerava a distribuição da 
DINAP melhor (e era). Ele não poderia transferir 
apenas o Carrapicho para a Chinaglia, pois correria 
o risco de ter seus outros títulos também recusados
pela DINAP.

 E foi assim, por uma recomendação 

que partiu da Abril Infantis enviada para a diretoria
da DINAP, que o Carrapicho parou de circular 
no número quatro, com o gráfico da distribuidora 
marcando tiragem de 32 mil exemplares. 
Alguns anos depois a DINAP comprou a Chinaglia, 
constituindo uma única razão social, dessa forma 
institucionalizando definitivamente o monopólio 
que há hoje na distribuição de
publicações em bancas.


Tony 41: Geralmente, produtos similares ao dele,
ou que venham a concorrer diretamente com
títulos deles eram e ainda são rechaçado... 
Conheci diversos casos deste tipo, infelizmente...
Você sabe, nem todo desenhista faz desenhos 
de figuras humanas, cômicos e infantis. 
Você se especializou em desenhos infantis 
ou faz outros estilos? Eu, durante anos, só trabalhei 
com desenhos cômicos. Foi duro voltar a fazer
desenhos de figuras humanas...

AVALONE:  Eu nunca fiz, profissionalmente, desenhos 
de figuras humanas. Já fiz alguns estudos básicos de 
anatomia porque aprendi que desenha melhor um 
Pato Donald quem conhece a anatomia humana.

TONY 42: Sempre achei mais fácil trabalhar e faturar
com desenhos cômicos e infantis, Aliás, sou fã de
carteirinha das series cômicas europeias, como:
Luke Lucky, Asterix, Mortadelo e Salaminho e outras.
São de rolar de rir... Agências de publicidade, você
teve experiência com algumas? Quais?

AVALONE: Nunca. Quadrinhos era o que eu 
realmente gostava e queria fazer. Principalmente 
o quadrinho autoral.

Tony 43: Nós que trabalhamos na área somos cientes 
de que a publicidade paga melhor. No entanto, adoramos
fazer HQs. Você não acha que isto é puro masoquismo?
Bem vindo ao clube, Rssss.

AVALONE: De jeito nenhum. Pode ser uma questão 
de opção, de amor ou de vocação. Mas não é masoquismo. 
Na publicidade também tem gente que poderia ganhar 
mais em outra área, mas adora fazer publicidade.

Tony 44: Devo respeitar seu ponto de vista...
Outro dia, ao ler, A História Secreta da Marvel, 
descobri que as publicações de quadrinhos nos Estados
Unidos também eram super instáveis. De repente, títulos 
novos surgiam e pouco tempo depois eram fechados 
devido as baixas vendas. Lá, como aqui, os Kirbys e 
Stan Lees da vida, viviam na corda bamba. 
Uma hora empregados, noutra desempregados. 
E, pelo visto, este mercado é assim em todo o mundo. 
Na sua opinião, o leitor é volúvel?

AVALONE: O leitor é, antes de tudo, um consumidor. 
Ele pode adorar uma determinada HQ, mas se a 
qualidade do produto cai ou fica muito caro, ele 
procura alternativas. E alternativas não faltam. 
Nesse sentido, todo consumidor é volúvel.

Tony 45: Cite algumas editoras com as quais você
 colaborou ou trabalhou e profissionais que trabalhou
 em parceria?


AVALONE: Editora de quadrinhos, como funcionário 
registrado, trabalhei na Abril, de 1978 a 1987.  
Na Noblet (em 1975 e em 1987), na Saber (1973) e no 
suplemento Clubinho (1972) eu era autor independente. 
Em estúdios, como funcionário registrado, trabalhei na
Start Filmes com o Walbercy Ribas em 1969
(que me demitiu, rs) e na Mauricio Produções 
em 1975. Na Ruy Perotti Produções (1977) 
eu não era registrado, trabalhava no estúdio mas
como prestador de serviço. Lá eu escrevia e 
desenhava HQs do Gabola e do Satanésio, como
já mencionei... Como autor eu ainda não trabalhei 
em parceria.

Tony 46: Experiências internacionais... você já fez 
quadrinhos ou desenhos para editoras de outro país? 
Sei que o saudoso Queiroz trabalhava 
pra Disney nos States...

AVALONE: Quadrinhos para editoras de outros países 
eu nunca fiz. Na fase de ilustrador, que durou uns quinze 
anos, fiz muita ilustração para livros infantis e didáticos
para editoras dos Estados Unidos, tais como Evan-Moor 
(Califórnia), Pitspopany (New York) e Wilkinson Studios 
(Chicago). Da Inglaterra desenhei muito para a Macmillan
(Oxford). Das editoras nacionais eu ilustrei livros 
para todas as grandes, tais como Atica, Scipione, FTD, 
Moderna, Do Brasil, Macmillan, Paulinas... Todas as 
grandes editoras do Brasil têm livros ilustrados por mim. 
Minha fase com ilustração didática foi extremamente 
produtiva e rentável.


Ilustrações para livros infantis












Tony 31: Mais uma vez, congratulation, grande guru.
Aprendi com o tempo que o mercado é cíclico: 
Hoje vende cowboy, amanhã HQs de guerra, depois de 
aventuras, eróticas e assim por diante. Conclusão: 
Para sobreviver nesse mercado louco é precisos ser 
eclético e estar antenado na onda do momento, 
você concorda?

AVALONE:  Sim, é bom ser eclético. Dá mais espaço para 
sobreviver profissionalmente. Eu procuro ser eclético 
e flutuar de acordo com a tendência do mercado, embora
sempre me mantendo dentro do campo do desenho. 
Na fase boa dos quadrinhos, fui quadrinista. Na fase boa 
dos didáticos, fui ilustrador. Atualmente está havendo 
uma fase boa no mercado de animação e adivinha... rsrs.
E o mercado da publicação independente está tomando 
uma forma atrativa para autores.

Tony 32: É isso aí...temos que nos virar nos 30... de alguns
anos para cá só dá mangás e super-herói, na ´praça.
Aliás, com a entrada dos mangas no país 
muitas publicações no estilo americano balançaram 
ou  fecharam. Até o Mauricio teve que se adaptar a 
moda criando A Turma Jovem da Mônica ao ver os
gráficos de venda desabarem. Qual é sua opinião 
sobre as HQs Made in Japan?

AVALONE: Eu, pessoalmente, nunca curti mangá. 
Acho legal, é um produto que tem seu mercado, seu 
valor e suas qualidades. Eu nunca me interessei, 
apenas por questão de preferência pessoal. 
Se de 90 para cá só dá mangá e super herói, é
porque há demanda do mercado. Quadrinho pode 
sim ser arte, mas é antes de tudo um produto comercial 
como outro qualquer. Aliás, um grande erro de alguns 
quadrinistas é ver o quadrinho apenas como arte ou 
cultura e não como produto comercial. 

As plataformas online de crowdfunding, o financiamento 

coletivo, estão contribuindo para mudar esse conceito
perante os artistas. Quem publica lá um projeo de 
quadrinhos aprende a ver na prática - e a duras penas - 
o quanto custa publicar uma HQ, como o projeto deve 
ser administrado e o quanto tem que vender para recuperar
o investimento.

Os autores independentes estão aprendendo

que fazer e vender HQ é muito semelhante a fazer e 
vender um outro produto qualquer). E isso é muito bom. 
À medida que o quadrinista vai assimilando esse conceito, 
ele vai se tornando um artista mais independente e
 mais empreendedor.

Tony 33: Atualmente, O que você anda fazendo?

AVALONE: Atualmente estou produzindo meus 
desenhos animados autorais e enviando para festivais. 
Não há qualquer pretensão nessas produções a não ser
aprender fazendo. É um ótimo exercício prático para 
evoluir na animação e chegar a um nível profissional. 
Sobre a ilustração, eu aposentei de vez, não tenho mais 
vontade nenhuma de fazer. Quanto aos quadrinhos, 
eu tenho resistido em voltar a fazer. Mas tenho a 
impressão que estou cedendo. 

Em julho de 2016 eu postei no Facebook uma das

antigas histórias do Carrapicho e me deu uma saudade. 
E também restaurei e digitalizei as antigas HQs do 
Carrapicho e publiquei digitalmente. Estão no Social Comics 
http://bit.ly/1KAYUTV) e na Amazon ( http://amzn.to/2oVqwQa ).
E a saudade alimenta a vontade de fazer de novo. 
Quem ainda não conhece o personagem e quiser conhecer, 
tem uma história completa disponível aqui nesse link: http://bit.ly/2nWyHaM


Animações feitas por Avalone






Capa: Edição digital com HQs publicadas em 1987






Capa da edição digital - Tem HQs inéditas




HQ Inédita - Só publicada digitalmente
Tony 34: Os quadrinhos digitais estão aí. Muitas 
editoras americanas, européias e até nacionais 
estão investindo pesado neles, apesar das vendas, 
especialmente no Brasil, serem ínfimas. Há quem diga 
que eles vieram pra ficar e que representam uma 
ameaça às publicações impressas. Qual é sua opinião
 a este respeito?

AVALONE: Os quadrinhos digitais hoje têm vendas 
ínfimas porque o público atual ainda é da geração do 
gibi impresso. Esse público, ao qual eu também pertenço, 
ainda tem prazer em sentir a textura do papel e o cheirinho 
da tinta. À medida que esse público for sendo renovado 
pela nova geração, somado ao aumento de usuários de 
dispositivos eletrônicos como tablets e smartphones, 
a adesão ao digital tenderá a expandir na mesma 
proporção em que o consumo do impresso tenderá 
a retrair. Quando uma criança hoje folheia publicações
 impressas, não vemos nelas o mesmo deslumbramento
 que ela tem pela multimídia. Porém, se aquela mesma
 publicação lhe for oferecida no formato digital, 
o deslumbramento é imediato. 

Essa é a geração que vai preferir o digital ao impresso, 

pois não terá a mesma afinidade com a textura do papel 
e o cheirinho da tinta que nós temos. Mas, apesar disso, 
quadrinhos digitais não são uma ameaça às publicações
impressas. No passado diziam que a TV ameaçaria o 
cinema. Depois a TV e o cinema se ajustaram e hoje 
convivem no mercado. 

O mesmo já está acontecendo no mercado dos 

quadrinhos. O digital e o impresso estão gradativamente 
se ajustando e até mesmo compartilhando
mercado. A futura predominância de autores 
independentes é inevitável. O mercado está
ficando mais fragmentado. 

As editoras já estão pescando os independentes que

vendem bem, tantos os digitais quanto os impressos.
Essa combinação tende a se estabilizar em breve. 
E isso é bom. Digitais e impressos serão complementos
um do outro. O admirável desse novo mercado editorial, 
que envolve o digital e o crowdfunding, é que
agora o autor é independente, não precisa de editora 
para publicar. 
Isso não quer dizer que a editora é dispensável, muito
pelo contrário. Quer dizer que os editores agora têm 
acesso fácil e instantâneo a talentos que, talvez, 
não teriam sem a publicação independente.

Se por um lado a facilidade da publicação independente, 
seja digital ou impressa, nos traz muitas obras de 
baixa qualidade, por outro lado temos acesso a muitas 
obras excelentes de autores independentes que jamais 
seriam publicadas por editoras convencionais por 
serem muito artísticas ou muito autorais e não 
terem apelo comercial.

Tony 35: Alguma frustração profissional? Eu, por exemplo, 
queria trabalhar com música ou ser jogador de futebol. 
Rsss. Dancei, agora só na outra “encadernação”, como diria os 
espíritas. Rsss.

AVALONE: Quando criança eu queria ser desenhista. 
Sou desenhista há 45 anos, desde os 17 anos de idade. 
E não vejo motivos para mudar de profissão. S
e eu tenho alguma frustração? Humm... deixa eu ver... 
não!  rsrs

Tony 36: Um sonho...

AVALONE: Já foi realizado.

Tony 37: Dizem que todo cara que faz HQs tem o espírito 
nfantil, que não crescemos nunca... Rssss. 
Você ainda lê gibis? Quais títulos?

AVALONE: Ainda gosto muito de ler quadrinhos, mas
 tenho comprado pouco. Não tenho preferência por títulos
 nem por personagens específicos. Eu compro pela 
qualidade da obra como um todo, prevalecendo 
o conteúdo à forma.

Tony 38: Astros e atrizes de Hollywood, que admira?

AVALONE: Eu não me levo pela preferência por artistas. 
Da mesma forma que com quadrinhos, eu assisto a 
um filme pela qualidade geral. E gosto de todos os 
gêneros, desde o mais divertido desenho animado 
até o mais tenebroso terror.

Tony 39: Qual é seu estilo de música preferido?

AVALONE: Eu ouço quase tudo. Quase. Tem muita 
coisa que não curto, claro. Faço uma playlist no 
Spotify, aciono o aleatório e deixo rolar.

Tony 40: Putz... ia me esquecendo: Em que dia, mês,
 ano, cidade, bairro, você nasceu?

AVALONE: Eu sou de 1954. Eu não nasci aqui em 
Santos, mas moro aqui há mais de trinta anos. 
Me considero santista.

Tony 41: Se você pudesse renascer hoje,
 faria tudo outra vez?

AVALONE: Faria, com certeza. E com a vantagem 
de já saber o roteiro, poderia revisar para fazer 
dar certo o que não deu.


Tony 42: Deus, religiões, fé...

AVALONE: Todos temos nossas crenças e a elas 
nos apegamos.

Tony 43: Acredita que há vida em outros mundos?

AVALONE: Acredito ser possível.

Tony 44: Família?

AVALONE: Casado há 38 anos, filhos formados, 
casados, bem encaminhados, o netinho renovando 
o ciclo e trazendo mais alegrias. Simplesmente família.

Tony 45: Meu querido bengala brother e guerreiro, o 
papo foi bom demais e longo. Só me resta agradecer, 
por sua especial atenção. Se quiser deixar e-mail, 
endereço do Face, site ou fone de contato fique a 
vontade. De repente, alguém pode precisar 
de seus préstimos.
Alguma mensagem especial para os jovens 
que desejam enveredar pelo setor editorial? Manda bala!

AVALONE: O que eu posso passar para o jovem 
aspirante é que se você sonha ser desenhista, não 
importa se é desenho de humor ou de figura humana, 
estude primeiro os fundamentos do desenho acadêmico, 
como perspectiva e anatomia. O que me foi ensinado 
no início de carreira é que até mesmo para desenhar 
bem um Pato Donald é bom conhecer anatomia 
humana. E se exponha! Publique suas HQs nas r
edes sociais, inscreva suas animações em festivais, 
apareça!




Tony 46: Valeu, meu amigo. Muito sucesso em seus 
negócios e até a próxima. See you later, cowboy!

AVALONE: Valeu, Tony! Abraço!

TONY 47: Outro grande mano amplexo pra você, 

guerreiro! E, grato, por sua colaboração! Tá valendo!

Por Tony Fernandes\Pégasus Studios –
Uma Divisão de Arte e Criação da Pégasus
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CONTATO: tonypegasus@hotmail.com